Com o tempo, tornou-se fácil não pensar. Tornou-se fácil para mim passar à frente, andar sem olhar para trás, continuar como se nada fosse. De repente já não custa, já não dói. Já nem sequer me lembro...
Mas depois de tanto tempo, o sorriso já não é igual. A gargalhada não soa ao mesmo e ecoa, desprotegida. A música parece distante e vazia, monótona, como se tudo fosse parte do mesmo álbum que ouvimos vezes sem conta, tantas que as músicas se misturam até parecerem sempre a mesma, em modo repeat, vezes e vezes sem conta.
No final da noite estou em casa, pronta para dormir, e por vezes a chuva cai lá fora. Não de uma forma mágica, não de uma forma romântica, nem sequer de uma forma agressiva ou violenta. Simplesmente, cai lá fora, e a cada vez percebo: Não me dói, e não me causa desprezo, e não me custa afastar-me sem olhar para trás, porque não sinto. Não sinto nada.
E nesta busca desenfreada pela ausência de emoções esqueci-me que a vida sem sentir é tão vazia que deixa de fazer... Sentido. Sem amor, sem paixão, mas também sem ódio, sem discussões, sem choros, sem dor, sem desilusão, arrependimento, sem nada, não sou, não respiro, não vivo. Nem sequer sobrevivo, definho sem vontade de voltar, sem vontade de ser.
Assim vou ficando, esperando por aquele dia: Aquele em que vens e me deixas sentir de novo. O dia em que me garantes que não vai voltar a ser o mesmo e que vai correr tudo bem. O dia em que me dizes que não faz mal sentir, desde que se sinta sem moderação, com paixão, com tudo, com cada centímetro do corpo, com cada suspiro e cada fôlego, desde que ame como se o mundo fosse acabar nos próximos segundos e a chuva volte a ser a dádiva sagrada que torna tudo brilhante e que limpa a alma como tudo, como nada.
Vou esperando por aquele dia em que me vou dizer que não há problema, está tudo bem. Mas sobretudo o dia - aquele dia - em que me vou permitir, a mim própria, voltar a sentir!...